

A Eleven Sports transmitiu, ontem, a vitória da A.S. Roma sobre o F.C. Porto (2-1) a contar para os oitavos de final da Liga dos Campeões, pela primeira vez em todas as operadoras pagas do país desde que iniciou a sua jornada por Portugal.
Na manhã do dia 12, o canal desportivo com sede em Londres chegou, finalmente, a acordo com a Nos, Meo e Vodafone deixando de ser um exclusivo dos assinantes da operadora Nowo (antiga Cabovisão).
Do ponto de vista económico não fazia qualquer sentido a Eleven continuar a pertencer, exclusivamente, à Nowo, detentora de apenas 10% do marketshare.
As negociações já existiam há bastante tempo, segundo consta o artigo do ECO. A Nowo representou os interesses da Eleven, de modo a obter acordos com as três operadoras, numa primeira fase.
A inépcia que a Nowo mostrou em rejeitar todas as propostas das três operadoras, apesar de insistência dos representantes do canal desportivo, nomeadamente, Jorge Pavão de Sousa, diretor-geral da Eleven Sports de Portugal, não só atrasou as negociações como fez com que a Eleven tomasse uma postura mais direta a partir do final de 2018.
O próprio presidente da Eleven Sports, Andrea Radrizzani, deslocou-se a Portugal no sentido de assegurar às operadoras de que as negociações teriam um desfecho positivo. Esta postura mais agressiva de Radrizzani mostrou ser eficaz mas também revelou um nível de urgência em acelerar o processo negocial, de maneira a que a Eleven Sports se estreasse em todas as operadoras com o A.S. Roma-F.C. Porto. Tendo em conta o time frame, a Eleven passou a negociar, diretamente, e sem a Nowo a mediar, com as operadoras do país, tendo Jorge Pavão de Sousa um papel essencial na conclusão do processo.
Em outubro, Pavão de Sousa revelava em entrevista ao ECO que o processo negocial já durava ainda antes de a Eleven Sports entrar em Portugal:
O que é o “tanto tempo”? Os canais foram para o ar a 15 de agosto. Estamos no ar há dois meses, com negociações que já vinham de trás, do ponto de vista da negociação que foi feita com o sublicenciamento dos direitos à Nowo.
O investimento feito nos direitos televisivos de transmissão não poderiam ter uma única via de receita e a Eleven apercebeu-se disso muito cedo. Os direitos televisivos são a única ferramenta que os canais desportivos possuem e determinam se o canal prospera ou não.
Não sendo economicamente rentável, por enquanto, ter apenas conteúdo original, pois não existe e se existe é direcionado a um público alvo muito reduzido, a SporTV e Eleven Sports investem milhões nos direitos televisivos. Os 500 mil assinantes da SporTV e os cerca de 40 mil clientes da Eleven em Portugal (17 milhões em todo o mundo) subscrevem porque querem ver o melhor conteúdo possível: os jogos.
A Eleven investiu 30 milhões de libras num pacote onde constavam os direitos televisivos referentes à La Liga, Eredivisie, Serie A e UFC, mas acabou por ficar apenas com os direitos do campeonato onde Lionel Messi atua.
O canal inglês decidiu terminar a sua parceria com a IMG, detentora dos direitos televisivos da Serie A e do campeonato holandês, tendo a Premier Sports assegurado os direitos do Reino Unido destes dois campeonatos, com as transmissões a começar já em finais deste mês. Quanto à UFC, a decisão foi tomada, unilateralmente, pelo líder das artes marciais.
Para além da Liga dos Campeões e da La Liga, o investimento dos ingleses ainda engloba os direitos televisivos da Bundesliga (1 milhão por ano- contrato de dois anos), a Formula 1 (2 milhões por ano- contrato de três anos), a Ligue 1 (contrato de três anos) e NFL.
Já a SporTV investiu 'apenas' 20 milhões de euros para transmitir a Premier League para os próximos três anos. O contrato anterior, também com duração de três anos, estava avaliado em 10 milhões de euros.
O negócio dos direitos televisivos tem assombrado as grandes estações televisivas de Portugal. A RTP não tem dinheiro, a SIC contenta-se com a Liga Europa e a TVI transmite um jogo por jornada da Liga dos Campeões.
A SIC vai pagar nos próximos três anos cerca de 4,8 milhões de euros (1,6 milhões por ano) para transmitir um jogo por jornada referente à Liga Europa. O contrato anterior de três anos (2015-2018) estava avaliado em 3,9 milhões de euros (1,3 milhões por ano).
Já a TVI também transmite um jogo por jornada e vai pagar em três anos uma quantia estonteante de 17,8 milhões de euros (5,9 milhões por ano). Só para transmitir UM JOGO por jornada. Apesar do preço, os resultados da transmissão da maior competição europeia foram razoáveis. Em setembro de 2018, 1 milhão de pessoas viram a Liga dos Campeões na TVI.
Em 2014, a RTP pagou 15 milhões de euros para transmitir a 'Champions' por três anos.
Tal como a Netflix, que vive dos direitos de transmissão de imensas séries e filmes pertencentes a outras entidades, a falta de conteúdo próprio pode, a curto prazo, danificar a Eleven apesar do seu impacto inicial ter surpreendido tudo e todos.
O paralelo que faço entre a Eleven e a Netflix é simples. A curto prazo ambos podem perecer se não se focarem em produzir conteúdo original rentável.
Um artigo fantástico da VOX explica como é que a Netflix pode perder grande parte da sua biblioteca televisiva por não ser dona da mesma. Durante anos, a Netflix aproveitou as debilidades das outras plataformas e limitou-se a arrendar-lhes conteúdo ao preço da chuva, tornando-se num projecto inovador e dono de um senhor monopólio.
As empresas a quem a Netflix aluga filmes e séries aperceberam-se disto e elas próprias pretendem lançar a sua plataforma de streaming (Disney, AT&T, Warner Media) e como detêm os direitos de grandes séries como Friends e The Office ou até filmes da Marvel e da Disney, ao lançarem essas plataformas vão tornar exclusivo essa panóplia de filmes e séries, optando por deixar de arrendar esse conteúdo à Netflix.
Várias plataformas irão dividir o mercado e a diferença está na originalidade e se a Netflix não começar a produzir o seu próprio conteúdo com maior vigor (teve sucesso com o Birdbox e com o Bandersnatch) poderá entrar em falência, não só por terem dívidas astronómicas, como está cada vez mais caro alugar conteúdo a terceiros. De modo a manter a série Friends na plataforma, a Netflix pagou 100 milhões de dólares à Warner Media por apenas um ano. UM ANO!
A Eleven continuará a existir enquanto gastar milhões em direitos televisivos. A Liga Espanhola não é suficiente, especialmente sem Cristiano Ronaldo, e notou-se que o deal breaker nos contratos assinados foi, certamente, a Liga dos Campeões. Porém, se conseguirem criar programas novos e ter no ar personalidades que sejam capazes de atrair audiências como a ESPN fez durante tantos anos, então terão uma estadia longa aqui em Portugal.
A realidade do problema que a Eleven Sports enfrenta é evidenciado por Pavão de Sousa em mais um excerto da entrevista que fez ao ECO:
Se chegar a uma base de clientes atrativa, sim, como é óbvio. Nós não estamos aqui a dizer que vamos atingir o break-even no primeiro ano. É irreal. Seria enfiar a cabeça na areia. Dentro do plano de negócios que temos a três anos, queremos entrar no terceiro ano com uma condição de rentabilidade a ser executada durante esse período. Isso vai ter de acontecer, via plataformas de TV, via outros modelos de monetização, via a entrada mais agressiva no mundo over the top [OTT].
É necessário mais do que uma via de monetização e ao reconhecer isso já é um passo em frente e revela que Pavão de Sousa está em cima do assunto e pode, no futuro, ser um ativo bastante importante para a Eleven Sports se afirmar em Portugal e competir ou destronar o monopólio da SporTV.
Existe uma oportunidade imperdível de mudar a balança de poder.
Apostar em conteúdo original seria um passo inovador em Portugal. Ninguém investe em personalidades capazes de atrair audiências e aí poderíamos tirar ilações dos americanos.
Mas também não são muitos os comentadores e jornalistas desportivos com grandes audiências.
E aí é que a Eleven pode desenvolver e diversificar o seu portefólio.
Twitter: https://twitter.com/MartimSilva1
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